sexta-feira, 12 de maio de 2017

O Meu Silêncio

By psyberartist (haunts of solitude) [CC BY 2.0 
(http://creativecommons.org/licenses/by/2.0)], via Wikimedia Commons

O meu calar extirpa minhas ideias e me deixa sozinho no amplexo deste quarto, envolto por sombras e silhuetas de objetos; por vultos estáticos que testemunham uma inconsciência fugaz dentro de um mundo amarronzado e escuro. Chamaria tudo isto de ambiente ou casa, mesmo que eu sinta que um lugar é onde se depositam corpos. Sim! Como num grande depósito de lixo humano, a cidade se estende silenciosa nesta madrugada fria e distante. Sim! Há distância entre a realidade e o desejo e há muito que se percorrer para se chegar às planícies onde o silêncio é o olhar ao invés do calar. Onde nada redunda porque se terá o que é somente necessário. Onde bastarei em mim, como um velho diante da morte. Neste lugar, morrerei num suspiro que liberta a alma para o vazio amplo e infinito e as palavras não precisarão mais ser ditas, dada a insignificância delas. Este será o momento do silêncio supremo e imperecível. Não agora.

Hoje o meu silêncio te ignora, como se deixada numa tumba do meu querer no mesmo tempo passado de onde e como abandonaste este cômodo. Ao sublimar rusgas, rasgou-me as palavras de paixão como se fosse possível amassar e destruir folhas etéreas, que somente estão em livros de lembranças na biblioteca da mente. Não se pode destruir o intangível, mas me tornaste delével, enclausurado por um sentimento renitente que atormenta minha parca razão e me deixa próximo ao limbo da loucura. Não mais a tenho, e talvez nunca a tive, mas a tua ausência me faz crer que num pequeno momento das nossas vidas, nossas paixões foram eternas. Quando o meu silêncio era apenas formado por palavras ditas para dentro, para o meu coração. Não precisávamos de som porque éramos o silêncio entre as notas musicais. Harmonizávamos duas solidões num cântico suave e atraente até entendermos que o verdadeiro calar estava no barulho que chamávamos de diálogo. Estava na compreensão de que nunca ouviríamos um ao outro, por mais que gritássemos.

domingo, 8 de janeiro de 2017

Guarde Meus Sentimentos

By Jiri Hodan [Public domain], via Wikimedia Commons

Não me é permitido dar-lhe o meu coração. Há uma eternidade dentro dele que não se contém e que eu gostaria de abortar seus momentos em tua vida. Mas não posso dar-lhe o meu coração, somente os meus sentimentos que nele estão. Apenas não os corporifico em tua pele, em teu sopro de homem. Não quero o sangue do meu coração como hemorragia da tua paixão, se debatendo dentro do meu peito para sentir-me penetrada no íntimo dos meus desejos. Quero apenas fechar os olhos para materializá-lo em suposta presença e sussurrar as vozes da minha alma. Levarei as minhas mãos até o teu rosto para nele repousar de uma vida fatigada. Quero tocá-lo com a calma dos dias vindouros, relegados à uma ausência de corpos. Quero decorar a tua face com o desenho miúdo e suave das minhas mãos. Quero sentir o teu sorriso com a sensibilidade de uma cega, que persegue o calor da tua tez, a umidade dos teus lábios e das lágrimas que sofrem a separação.  Sentirei o teu abraço a me apertar e a travessura das tuas mãos a me explorar. Ouvirei as batidas suaves do teu coração a ritmar minha vida. Ah! Você me tem não tendo; você me quer não querendo. Serei sempre apenas palavras na concessão da minha sensibilidade, que você a tem. Serei apenas uma mulher nos sons que tumultuam tua percepção, que marejam os teus olhos e embargam tua voz. E você será sempre um homem em sofrimento por não ser capaz de amar.

Então recebe os meus sentimentos e os guarde como um tesouro atemporal. Encontrará neles a jovialidade já esquecida e a maturidade que nos faz unidos pela solidão. Terás todas as chaves do que sinto para me encontrar em qualquer instante, em qualquer distância. Guarde-os como numa caixinha de música e se baile nos meus sonhos.

Por sugestão de Ana Claudia Mello

São Jorge - Saint George

  Imagem gerada pelo Midjourney São Jorge! Mostraste a coragem misericordiosa que me livrou do dragão que sempre carreguei em meu coração. I...